O gráfico que mudou o clima: como o 'Taco de Hóquei' virou símbolo da ciência e da luta pela verdade

  • 31/10/2025
(Foto: Reprodução)
Entenda a crise do clima em gráficos e mapas Em 1998, um estudo científico publicado na revista científica "Nature", transformou para sempre o debate sobre as mudanças climáticas. O trabalho, liderado pelo climatologista estadunidense Michael E. Mann ao lado de Raymond S. Bradley e Malcolm K. Hughes, reconstruiu as temperaturas do Hemisfério Norte ao longo do último milênio e revelou algo alarmante: um aumento abrupto na temperatura global a partir do século XX, como ninguém havia comprovado até então. O resultado da análise foi uma curva que ficou conhecida como "Gráfico do Taco de Hóquei" — uma linha quase estável por séculos, seguida de uma elevação acentuada no final, como a lâmina de um taco. Gráfico do taco de hóquei Arte/g1 Mais do que um gráfico, a imagem se tornaria um ícone da ciência climática moderna — e, ao mesmo tempo, o centro de uma das campanhas de desinformação mais intensas da história recente. Como se reconstrói o clima de mil anos Sem termômetros no passado distante, Mann e sua equipe recorreram aos chamados dados “proxy” — registros naturais que preservam pistas sobre o clima, como anéis de árvores, núcleos de gelo, corais e sedimentos de lagos. Cada um deles guarda informações sobre temperatura, precipitação e composição atmosférica de diferentes épocas. a COP 30 e nosso futuro 📱Baixe o app do g1 para ver notícias em tempo real e de graça A grande inovação de Mann foi conseguir combinar milhares desses dados diversos em uma base em que eles pudessem ser comparáveis e calibrá-los com medições modernas, usando modelos estatísticos avançados. O resultado foi uma reconstrução ano a ano das temperaturas desde o ano 1000 até o final da década de 1990. O rigor técnico garantiu que os padrões climáticos fossem identificados com alto grau de confiabilidade — e a mensagem era clara: o século XX se destacava como um ponto muito fora da curva. O salto do século industrial Os dados revelaram um padrão inquietante. Após séculos de relativa estabilidade, o aquecimento global começou a acelerar justamente durante a Revolução Industrial, quando o uso de combustíveis fósseis disparou e a concentração de dióxido de carbono na atmosfera cresceu em ritmo nunca visto. O estudo concluiu que os gases de efeito estufa se tornaram a principal força por trás da mudança climática moderna, superando fatores naturais como variações solares e erupções vulcânicas. Na linguagem visual do gráfico, o bastão do taco representava mil anos de estabilidade; a lâmina, o súbito e exponencial aumento das temperaturas a partir de 1900. A pesquisa comprovou que a única forçante climática que coincidia com aquecimento vertiginoso foi o aumento das emissões de CO2. Uma forçante climática é qualquer fator que possa alterar o balanço energético da Terra. Os pesquisadores testaram diferentes forçantes climáticas — como variações solares e atividade vulcânica —, mas apenas o aumento do CO₂ explicava o aquecimento observado. O gráfico que virou alvo político Em 2001, o “Taco de Hóquei” foi incluído no Terceiro Relatório de Avaliação do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) como uma das evidências centrais do aquecimento global causado por atividades humanas. A repercussão foi imediata — e também explosiva. M. E. Mann, R. S. Bradley, and, M. K. Hughes, “Global-Scale Temperature Patternsand Climate Forcing Over the Past siz Centuries,” Nature Grupos políticos e think tanks (que são instituições que fazem a ponte entre o conhecimento acadêmico/científico e as políticas públicas) passaram a atacar não apenas o gráfico, mas o próprio cientista. O que era um debate técnico virou uma guerra cultural e ideológica. Mann foi acusado, sem provas, de manipular dados, e sua vida pessoal e profissional virou alvo de campanhas de difamação. Da ciência à perseguição Entre 2005 e 2017, o climatologista enfrentou uma sequência de episódios que misturavam política, difamação e assédio: 2005: grupos conservadores começaram a questionar publicamente a integridade de Mann. 2009: o chamado “Climategate” — hackers divulgaram e-mails de cientistas fora de contexto, acusando-os de fraude. Investigações posteriores provaram que não havia irregularidades. 2010: o procurador-geral da Virgínia tentou abrir uma investigação contra Mann, mas o caso foi arquivado por falta de fundamento. 2012: comentaristas políticos compararam o cientista a criminosos condenados. Mann processou-os por difamação. 2024: após 12 anos de batalha judicial, ele venceu o processo, recebendo US$ 1 milhão em indenização. “Esses ataques não eram sobre ciência — eram sobre poder”, declarou Mann anos depois, em entrevista à Associated Press. A verdade confirmada pela ciência Apesar das campanhas de desinformação, a comunidade científica seguiu confirmando a validade do gráfico original. Pesquisas posteriores — como as de Jones e Moberg (2003), Moberg et al. (2005) e Juckes et al. (2007) — reafirmaram o mesmo padrão de aquecimento acelerado no século XX. Os relatórios seguintes do IPCC, em 2007 e 2013, consolidaram o consenso: o planeta está aquecendo em velocidade inédita e a causa principal é humana. O “Taco de Hóquei” tornou-se, assim, um símbolo da integridade científica diante da negação organizada. M. E. Mann, R. S. Bradley, and, M. K. Hughes, “Global-Scale Temperature Patternsand Climate Forcing Over the Past siz Centuries,” Nature Um alerta que ecoa em 2025 Mais de duas décadas após a publicação do estudo, o mundo colhe as consequências do que ele antecipou. Segundo a NASA e a NOAA, 2024 foi o ano mais quente da história, com temperatura média global ultrapassando 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais — um marco simbólico e alarmante. Hoje, com mais de 8 bilhões de pessoas no planeta e recordes sucessivos de calor, secas e enchentes, a urgência de agir nunca foi tão evidente. “Os dados estão aí há 25 anos. O que falta é coragem política”, dizem especialistas em clima da ONU. Entre a ciência e o negacionismo O caso de Michael Mann expôs o lado sombrio da relação entre ciência e o negacionismo. Ao revelar a verdade sobre o clima, ele se tornou símbolo de uma era em que a desinformação é usada como arma política e ideológica. Como funcionam as discussões da COP, a conferência do clima da ONU Seu trabalho mostrou que comunicar a ciência com clareza pode ser tão perigoso — e tão necessário — quanto descobri-la. “O gráfico do Taco de Hóquei é mais do que uma linha no papel”, escreveu Mann em seu livro The Hockey Stick and the Climate Wars. “É o retrato do que estamos fazendo com o planeta — e do que ainda podemos escolher mudar.” O legado de um gráfico O “Taco de Hóquei” abriu caminho para novas pesquisas ao tornar acessível e clara a informação que até então parecia dispersa e difícil de explicar. Foi precursor de muitos cientistas que hoje sabem que o caminho é zerar as emissões. O professor da Universidade de São Paulo, André Simões, doutor em planejamento energético, já representou o Brasil em mais de 5 conferências do clima e fará parte da delegação oficial que representa o Brasil este ano também. Em seu relatório mais recente, que será apresentado na Cop30 em Belém este ano, ele revela que os dados mostram que em vez de transição o que se observa é um empilhamento energético, fontes alternativas como solar, eólica vem crescendo no Brasil à medida em que o uso de energia de origem fóssil também se amplia. Simões conta que o problema é mais complexo do que se imagina, “não é exatamente apenas as emissões. Depois que os gases são emitidos, acontece a estabilização, uma molécula de CO2 pode permanecer por cerca de 100 anos na atmosfera, então mesmo que a gente parasse hoje as nossas emissões, os efeitos do aquecimento global seriam perceptíveis pelos próximos cerca de mil anos.” Por isso que para estabilizar o clima é necessário frear as emissões. Simões lembra que cerca de 72% dessas vêm da nossa produção e consumo de energia e que 80% da oferta energética primária mundial - não só hoje, mas há 4 décadas - é proveniente de carvão mineral, petróleo e gás natural. “O que nós estamos vivendo é uma crise civilizatória e o caminho é praticar uma nova maneira de existir nesse planeta que não seja baseada no consumo”, defende o professor. LEIA TAMBÉM: 'Empresas como a Petrobras têm que deixar de ser apenas de exploração de petróleo', diz Marina Silva Comitiva da ONU inspeciona locais da COP 30 e aprova planos de segurança, mobilidade e saúde 'O que aprendi ao viver um ano sozinho com um gato em uma ilha remota' Qual é o papel da China na crise climática?

FONTE: https://g1.globo.com/meio-ambiente/cop-30/noticia/2025/10/31/o-grafico-que-mudou-o-clima-taco-de-hoquei-simbolo-da-comprovacao-ciencia-e-da-luta-pela-verdade.ghtml


#Compartilhe

Aplicativos


Locutor no Ar

Peça Sua Música

Top 5

top1
1. Maria Magdalena

Sandra

top2
2. All Night Long (All Night)

Lionel Richie

top3
3. Stayin Alive

Bee Gees

top4
4. Ordinary World

Duran Duran

top5
5. Girls Just Want To Have Fun

Cyndi Lauper

Anunciantes